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De tudo um pouco

  • nataliarib
  • 23 de fev. de 2021
  • 2 min de leitura

Anúncios escritos à caneta, em um recorte de papelão. Produtos dos mais variados e de segmentos distintos apresentados na simplicidade da rua, sob a proteção de um guarda-sol. Um homem de chapéu, sentado na calçada, no pequeno espaço de sombra que uma árvore oferece. É impossível passar pela Rua Sá e Souza, em Boa Viagem, e não ter a atenção sequestrada pela engenhosidade de José Jailton de Souza, 52 anos. Um homem que enfrenta uma grave doença e ainda luta para buscar o sustento no comércio informal.


- Poxa, mas o senhor tem tudo e um pouco mais. “Tenho é de tudo um pouco”. Enfático, Souza defende a proposta da barraca. Se está escrito “De tudo um pouco” no papelão, é assim que ele quer que o negócio seja chamado. Deslizo mais uma vez na expressão enquanto conversamos, mas ele volta a lembrar que tem é “De tudo um pouco”. E com razão. Não há melhor forma de explicar.


Imagine uma mesa de madeira, sustentada por cavaletes, dando palco a uma cartela de utilidades. Tem chaveiro, abridor de garrafa, descascador de batata, suporte para TV, espelho, cortador de unha, calculadora, alicate, rádio, baralho de cartas, isqueiro, máscara, chapéu, boné, guarda-chuva, pendrive e bicho de pelúcia. Pelo menos, é o que os olhos dessa repórter conseguiram alcançar.


Retraído e um tanto desconfiado, Souza demora a entender os motivos da nossa conversa. Ele tende a duvidar que sua barraca aguce a curiosidade de alguém. Para ele, a loja tem objetivos simples e óbvios: conversar com os clientes e vender algumas coisinhas. Com certa insistência, ele começa a contar o que o fez estar ali. “Para não ficar parado eu precisei fazer isso".


Ele deixa escapar que há apenas três anos tem a loja que vende de tudo, ou de tudo um pouco. Fico intrigada, pois o pó sobre os produtos e a deterioração aparente de alguns deles me levaram a pensar que existisse há mais tempo. E existia. Antes de ser diagnosticado com um câncer no pescoço, sobre o qual não quis dar detalhes, ele vendia as miudezas em casa, nos fundos da atual calçada.


Com o diagnóstico da doença, o homem precisou deixar o trabalho de carteira assinada em uma marmoraria. Conseguiu auxílio-doença do INSS e encarou o tratamento. Mas a renda não atendia às necessidades da família. Assim, teve de colocar os itens na vitrine pública para garantir alimento a ele, à mulher e ao filho. “Estou quase pronto. Em junho vou voltar, se Deus quiser”. Seu desejo é retornar para a empresa e se ver livre da doença que assusta apenas com o nome. Além de quinquilharias, o “De tudo um pouco” tem espaço para a fé.

Ao fundo, o idealizador da loja, o pernambucano José Jailton de Souza


Texto e foto: Natalia Ribeiro

 
 
 

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